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Vacina pouca, me imunize primeiro: uma ode à aristocracia

7 de dez. de 2020



por Fernando Duarte 

Semana passada tomou parte do noticiário o pedido de um grupo de promotores do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) para que eles tivessem prioridade na fila para ter acesso à vacina contra o novo coronavírus. Em condições normais, isso deveria ser encarado como galhofa. No meio de uma crise sanitária sem precedente nos últimos 100 anos, o escárnio toma outras proporções e mostra que a sociedade brasileira é organizada por castas, mesmo que exista a pretensão legal de que todos são iguais, com direitos e deveres iguais.

 

Para esses seletos promotores, os direitos deles merecem passar à frente de outros grupos de risco, delimitados por autoridades sanitárias em todo o mundo: idosos, pessoas com comorbidades e profissionais de saúde, que estão na linha de frente do combate à pandemia. Porém, por obra divina, esses promotores paulistas devem ter prioridade para receber a imunização, afinal, são pessoas melhores do que todos os demais brasileiros, que devem aguardar pacientemente pela sua vez de receber a vacina.

 

Queria eu que esse caso fosse isolado. Não vão faltar castas superiores que vão se arvorar ao direito de receber primeiro o imunizante. Isso faz parte da sociedade brasileira. Há sempre um jeitinho de buscar privilégios, de conseguir passar a frente de outra pessoa. Os promotores em questão não serão os únicos a fazer o pedido. Talvez tenham sido os mais corajosos em fazer isso em público, sem recorrer a subterfúgios muito comuns no cotidiano nacional, aquele velho hábito do fulano que conhece beltrano que vai conseguir com ciclano.

 

Precisamos encarar a realidade: será rotina meio mundo de gente tentando passar na frente na fila pela imunização contra a Covid-19. Por isso é acertada a proposta do governo federal de impedir a venda no setor privado do imunizante. Caso houvesse a liberação, apenas a elite econômica do país teria acesso à vacina, enquanto o histórico sucateamento do sistema público será responsável por aplicar o medicamento nas classes menos abastadas - afinal, no Brasil, a classe média acredita ser rica, então isso acaba abrangendo um pouco mais o escopo da crítica.

 

É necessária muita cautela para que a corrida pela vacina não se torne mais um episódio em que a desigualdade entre os brasileiros fala mais alto do que os direitos da população. A lógica do “farinha pouca, meu pirão primeiro” não deveria valer para escolher quem vive. Estaremos dispostos a abrir mão desse luta de classes para vencer a Covid-19?




Fonte:

https://www.bahianoticias.com.br/fernando-duarte/208-vacina-pouca-me-imunize-primeiro-uma-ode-a-aristocracia.html