Tradição das festas juninas em diversas cidades do interior da Bahia, a guerra de espadas está proibida no estado por iniciativa do Ministério Público do estado (MP-BA) desde 2011. Este ano, além de campanha de conscientização, o órgão mantém plantão com promotores e servidores nas cidades onde o costume é mais arraigado, como Cruz das Almas e Senhor do Bonfim. Para reforçar a fiscalização foram deslocados profissionais de outras regiões.
A campanha A Vida Vem Antes da Tradição tem foco principal nestes dois municípios e em Santo Antônio de Jesus, Sapeaçu, Muritiba, Cachoeira, Nazaré, Muniz Ferreira, São Felipe, São Félix, Castro Alves e Campo Formoso. A meta é alertar as pessoas que fabricar, possuir e soltar estes fogos é crime, com penalidade de até seis anos de prisão. “Não podemos compactuar com uma tradição que afronta o direito à saúde e segurança pública, e que representa a prática de um crime”, afirmou a procuradora-geral de Justiça, Ediene Lousado.
“As pessoas não têm a devida compreensão dos riscos e consequências da guerra de espadas”, destacou a procuradora, salientando que “o direito individual não pode se sobrepor ao interesse social”.
De acordo com o coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal (Caocrim) do MP-BA, promotor de Justiça Marcos Pontes, a proibição se sustenta no Estatuto do Desarmamento (2003), “porque a espada é um artefato não regulamentado e, por isso, proibido no Brasil”, explica.
Ele ressaltou que este ano outros órgãos estão envolvidos na campanha, como a Polícia Rodoviária Federal, a polícia e bombeiros militares, o Exército e o Departamento de Polícia Técnica.
O propósito do MP-BA, conforme Pontes, “não é acabar com as tradições, pois no festejo de São João existem outros costumes que devem ser preservados, como a música, a dança, as comidas e bebidas típicas que fazem parte da cultura popular”.
Costume
Na cidade de Cruz das Almas (situada a 137 km de Salvador), apesar da proibição judicial e do aparato policial para reprimir a prática, diversos adeptos mantiveram o costume e soltaram os artefatos em vários pontos da cidade no ano passado.
“Já passei São João em Cruz das Almas, antes e depois da proibição. Gosto da adrenalina, mas sigo de longe. Depois da proibição, é mais difícil ver os fogos nas ruas”, disse o motorista Francisco Almeida.
Morador de Feira de Santana, o motorista afirmou que a proibição deu uma roupagem “subversiva” à manifestação.
“Espero que seja regularizado, pois ficará mais seguro participar e ver. Acho que deveriam delimitar um espaço, onde só quem quiser participar entre”, sugeriu.
SENHOR DO BONFIM RECORRE, MAS STF RATIFICA IMPEDIMENTO
Em Senhor do Bonfim (a 389 km de Salvador), onde a prefeitura recorreu da decisão do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) proibindo a manifestação já no ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a liminar de proibição, medida do ministro Luiz Fux.
Ele seguiu decisão anterior (de 2018) da ministra Carmen Lúcia, quando ela sustentou o embargo, alegando que a tradição representa risco de morte aos praticantes e outras pessoas, além do perigo para os bens materiais de terceiros.
O argumento dos defensores do costume é que, além de ser uma tradição enraizada na população, a proibição afeta de forma negativa a economia da cidade, com a redução de turistas nas festas juninas, que eram atraídos pela guerra de espadas.
Segundo o superintendente de Turismo local, Rodrigo Wanderley, o município luta contra o que definiu como “criminalização da manifestação que está passando pelo processo já enfrentado pelo samba, capoeira, religiões de matrizes afro-brasileiras e a vaquejada”. Para ele, que é antropólogo, “ao invés de proibir, o MP deveria ter chamado os espadeiros para assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e criar condições de manter a tradição”.
Miriam Hermes | Foto: Caio Csermark