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Racismo e machismo afastam mulheres negras dos espaços de poder, apontam políticas

8 de mar. de 2018
Racismo e machismo afastam mulheres negras dos espaços de poder, apontam políticas
Foto: Montagem / BN

No estado mais preto do Brasil, a primeira deputada federal negra, Tia Eron (PRB), foi eleita em 2014. Até hoje, não conseguimos emplacar uma mulher negra como deputada estadual. De acordo com a pesquisa "Estatísticas de Gênero: Indicadores sociais das mulheres no Brasil", publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta quarta-feira (7), a Bahia é o estado com menor participação feminina no Congresso Nacional. Mas quando se trata da participação de mulheres negras nos espaços de poder a situação piora consideravelmente: na Câmara Municipal de Salvador, dos 43 cargos, apenas 8 são ocupados por mulheres e, dentre elas, duas são negras. De 63 deputados na Assembleia Legislativa do Estado da Bahia há oito mulheres e nenhuma é negra. A situação é similar quando se trata de deputados federais. Dos 39 parlamentares baianos eleitos em 2014, apenas três são mulheres e uma só é negra - no caso, Tia Eron, que atualmente deixou a Câmara para atuar na Secretaria de Promoção Social e Combate à Pobreza (Semps). "Hoje você tem a maior bancada de mulheres no Congresso Nacional. Somos 54. Entretanto, você não consegue aprovar a lei que garante cotas para que o assento esteja com elas, não com eles. Aí você tem um projeto para que, quando uma mulher parlamentar se licencia, a suplente seja uma outra mulher. Senão a conta nunca estará equilibrada", declarou. Para ela, o histórico que envolve patriarcado, discriminação de gênero e violência doméstica deixou graves sequelas que se refletem em um sistema desigual. "Em sua maioria, são homens que estão à frente desses espaços de poder. O espaço de poder é o lugar onde se negocia, onde se reivindica direitos, onde você senta para bater na mesa e dizer 'eu quero'", apontou. Uma das duas vereadoras negras da Câmara Municipal, Marta Rodrigues (PT) sugere que apesar do avanço nas discussões raciais, a representatividade continua pequena. "Aonde é que nós mulheres negras estamos agora? A maioria está desempregada. Esse nosso espaço aqui, com 43 cadeiras. Quantas mulheres tem? Oito. E quantas negras tem? Eu e Ireuda. Se você for pegar na AL-BA, quantas cadeiras? 63. Quantas mulheres? Oito. Quantas negras? Nenhuma. Então é esse debate que a gente tem que fazer, apresentando nossas pautas, buscando políticas públicas para inserir as mulheres negras nesse espaço", comentou. Sobre a conquista desses lugares, a vereadora Ireuda Silva (PRB) afirma que há uma forte resistência em relação à ocupação de mulheres, principalmente as negras. "Você observa que os vereadores homens se 'abancam' das bancadas. Se nós mulheres não formos lá, eles ficam ali por toda a vida. Há uma resistência e não é só aqui. É em todos os lugares. Isso tem sido uma luta árdua de nós mulheres", declarou Ireuda. A subrepresentação racial e feminina também aparece no âmbito do Executivo - há cinco secretárias entre os 24 titulares das pastas estaduais e, entre estas, três são negras. Uma delas é Olívia Santana (PCdoB), responsável pela Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte da Bahia (Setre). "O racismo, cruzado com o machismo, é que atrapalha o caminho das mulheres negras. A gente vive em uma sociedade patriarcal e racista, que impede o caminho das mulheres negras na atuação política. É como se a vida pública fosse para os homens e às mulheres cabe a vida privada. E para as negras, o subemprego, a ausência de representatividade. Ela pode ser no máximo a eleitora, nunca a eleita", disse Olivia. E para resolver a situação não basta simplesmente ter candidatas negras, mas sim que os partidos sustentem candidaturas viáveis, estruturadas, com campanhas bem financiadas. "Quando a gente debate empoderamento, nós precisamos ter como principal foco a presença das mulheres negras na democracia representativa. Porque nós não estamos nem subrepresentadas, nós estamos invisíveis. Nós não podemos falar de empoderamento de uma forma genérica, nós temos que colocar o dedo na ferida. E os partidos políticos precisam responder. Porque quem financia, quem estrutura as campanhas políticas são os partidos", disse. "Então nós não queremos discutir apenas o direito das negras serem candidatas. Nós queremos discutir a necessidade de, quando as urnas se abram, nós tenhamos negras eleitas", completou. Segundo Olívia, o debate racial sofre uma rejeição muito grande por conta da falsa ideia de uma democracia racial existente no Brasil. "Isso não existe, infelizmente. A desigualdade é brutal no acesso a tudo. O acesso a empregos decentes, a salários, a promoções dos cargos das empresas privadas e também na área pública. A gente conta nos dedos das mãos a presença negra", criticou. Secretária Municipal da Reparação, Ivete Sacramento concorda com Olívia e aponta que há uma pré-disposição social à exclusão de mulheres negras no poder político. "E aí quando você chega, o difícil é manter. O racismo e a exclusão de gênero afasta essas mulheres dos espaços de poder, existe uma campanha velada para que a gente não chegue nesse lugar", declarou. Apesar de ressaltar que há um sistema que invisibiliza mulheres negras no poder político, Ivete diz acreditar que a próxima geração de "guerreiras e mulheres conscientes" será mais representada. "Nós detemos o poder que nem imaginamos. Se nós nos juntássemos, ganharíamos qualquer eleição, pois hoje somos maioria em qualquer estatística. Ainda não temos a força que deveríamos ter, mas acredito que a próxima geração será diferenciada", avaliou.

por Ana Cely Lopes / Rebeca Menezes